terça-feira, 9 de outubro de 2007

A LOJA REBELDIA




Decorria o mês de Abril de 1929 quando a sede do Grande Oriente Lusitano foi assaltada por elementos da Guarda Nacional Republicana e da Polícia, com a participação de numerosos civis. Foram presos e identificados todos os maçons que se encontravam no Palácio Maçónico, à excepção dos oficiais das Forças Armadas.
Na altura, foram apreendidos inúmeros documentos e cometidos actos de vandalismo, nos quais se incluiu a destruição dos templos, estatuária vária, documentação, livros, etc.. A partir desse momento iniciava-se uma nova era de obscurantismo em Portugal, inviabilizando, portanto, a livre reunião dos maçons, que passaram para tal a depender do livre arbítrio do Governo Civil de Lisboa.
De Maio de 1929 a Março de 1930 o Palácio Maçónico encerrou as suas portas, voltando mais tarde a realizarem-se nele reuniões, embora limitadas a poucos irmãos, até 1931. Neste ano, as portas foram formalmente seladas pela Polícia e, finalmente, em 1935 a Maçonaria Portuguesa passou à clandestinidade, por ter sido ilegalizada.
Foi neste contexto que um grupo de onze maçons ergueu colunas de uma nova Loja, a Rebeldia, instalada no dia 1° de Maio de 1929, segundo Decreto do Grão-Mestre datado de 11 de Abril desse ano.
Inicialmente, fora programado para o dia 20 de Abril, porém, o assalto ao Palácio Maçónico em 16 desse mês, não permitiu a manutenção da data que havia sido aprazada.
Desta forma e em semi-clandestinidade, a instalação decorreu, em casa do Ir:. Raul Wheel-House, na rua de St° António dos Capuchos, n° 94-2°, no Campo dos Mártires da Pátria, em Lisboa, sendo a primeira reunião de uma Loja lisboeta fora do Palácio Maçónico, depois do governo da Ditadura ter iniciado as hostilidades contra a Maçonaria. Foi seu primeiro venerável Ir:. João de Barros (Luís Gonçalves Rebordão) que tinha sido iniciado em 20 de Setembro de 1923, o qual, como Grão-Mestre, teve a seu cargo a chefia da Ordem Maçónica de 1937 a 1974, ou seja, praticamente durante todo o tempo que durou a ditadura salazarista.
Desta forma, no dia 1 de Junho de 1929 era iniciado o primeiro maçon nesta Loja, de seu nome, Duarte de Almeida.
Porém, a origem desta Oficina remonta uns anos atrás. Assim, em 1924, o Ir.•.João de Barros, Ven.•. Mestre da Resp .•. Loja Revolta, de Coimbra, com o acordo dos obreiros da sua Oficina, incentivou os lir.•. estudantes dos seus Quadros, a residirem em Lisboa e fundarem uma Loja nesta cidade, similar à que pertenciam, ou seja, uma loja composta essencialmente por homens ligados às universidades; estudantes e professores.
Foi deliberado que a Loja adoptasse o Rito Francês e que o seu título distintivo fosse o de Rebeldia, como o n° 439 ao Vale de Lisboa.
Assumiram cargos na Loja em 1929 os seguintes lir.•. :

Venerável – Luís Gonçalves Rebordão
1° Vigilante – Júlio Ribeiro da Costa
2° Vigilante – Alberto Cardoso do Vale
Orador – Alberto Martins de Carvalho
Orador Adjunto – Mário Lopes Pinto Coelho
Secretário – Eurico de Aguiar Cruz
Tesoureiro – Raul Cardoso Madeira
Hospitaleiro – Carlos Soares de Oliveira
Mestre-de-cerimónias – Manuel Gregório Jr.
1° Experto – António Augusto Pires de Carvalho
2° Experto – António Freitas Pimentel
Representante à Grande Dieta – Alberto Martins de Carvalho

Desde o dia 1° de Maio até Dezembro desse ano, foram efectuadas sete
iniciações, destes, o Ir.•. Jean Jacques Rousseau (Manuel Augusto Rosa
Alpedrinha) um bom e assíduo obreiro, pouco tempo permaneceu na Oficina
uma vez que teve de optar entre esta e o Partido Comunista do qual era
militante. Foi perseguido pela ditadura, passando longos anos nas prisões, de entre elas, o Tarrafal.
Não obstante as perseguições, entre os anos de 1929 e 1935 a Rebeldia
conseguiu recrutar e iniciar muitos estudantes universitários e outros que se
vieram a distinguir na vida profana. Instalou também um triângulo numa aldeia da Beira.
É de justiça que se refira aqui os cinquenta primeiros Obreiros da Resp.•. L.•. Rebeldia, como segue:

. Luís Gonçalves Rebordão11
. Alberto Martins de Carvalho12
. Júlio Ribeiro da Costa13
. Alberto Cardoso do Vale
. Eurico de Aguiar Cruz14
. Raul Cardoso Madeira
. Manuel Gregório Jr.15
. Carlos Soares de Oliveira16
. António Augusto Pires de Carvalho17
. Mário Lopes Pinto de Castro18
. António de Freitas Pimentel19
. Virgílio Rebordão
. José Alves da Cruz Ferreira
. Manuel Augusto Rosa Alpedrinha20
. Ramiro Hugo Bastos Gonçalves
. José dos Santos Clara
. Francisco Joaquim dos Santos
. Carlos Lopes de Aboim Inglês21
. José Meneses Torres
. António Granja22
. Vítor Hugo Velez Grilo
. Amândio Ferreira Marques
. Asdrúbal João de Aguiar
. Mário de Lima Alves23
. Fernando Guimarães de Oliveira
. Artur Morgado Ferreira dos Santos Silva24
. José Augusto das Neves Cabral
. Roberto Barreiro Pedroso Neves
. Henrique Teixeira de Queiroz de Barros25
. Viriato Hermínio de Mascarenhas e Mesquita
. Aníbal de Faro Viana
. Luís Carlos Azevedo de Morais
. Mário Governo Montês
. António Henrique Baité
. Norberto Cardigo dos Reis
. José Maria Barbosa de Magalhães Godinho26
. Manuel Joaquim Mendes27
. João de Almeida Lucas
. José da Silva Rebordão
. José Águas Cruz
. João António de Aguiar
. Mário de Carvalho Alcântara
. Artur Rebelo de Almeida
. Fernando Augusto Leal
. Manuel Pereira Crespo28
. Daniel Neves Sales Grade29
. Alexandre Maria da Costa Vaz
. José Maria Conte Caldeira de Ordaz
. António Agostinho

Muitos destes Oobr.•. sofreram torturas, prisão e degredo por delito de opinião.
De salientar, que mesmo correndo os maiores riscos, se efectuaram reuniões e até iniciações, durante os anos de clandestinidade, servindo as instituições para-maçónicas como a Escola Oficina nº1, para reuniões em segredo.
Na sequência do 25 de Abril e após a recuperação do Palácio Maçónico, Finalmente, em Liberdade, no dia 15 de Março de 1975 teve lugar na sede do Grémio Lusitano, a primeira reunião do Grémio Rebeldia, em 1ª convocatória, com a presença de nove dos seus doze obreiros no activo, nomeadamente Dr. Luís Gonçalves Rebordão30. Henrique Corte Real, Prof. Doutor Adelino da Palma Carlos31, Comandante José Neves Sales Grade, Brigadeiro Daniel Neves Sales Grade, José Maria Bastos, Capitão Júlio Ribeiro da Costa, Dr. José Souto Teixeira e José Marques Simões. Justificaram as suas ausências o Dr. José Alves da Cruz Ferreira, Virgílio Rebordão e Raul Cardoso Madeira.
Chamados irmãos que se encontravam a coberto, caso do Ir .•. Pereira Crespo, último Ministro da Marinha do anterior regime, pediu escusa com uma carta delicada; o Ir.•. Henrique de Barros, não obstante ter sido convidado através de mais que uma carta, nunca respondeu.
Em 1981, devido ao envelhecimento e morte de alguns dos Oobr .•. da Oficina. Esta acabou por abater Colunas. Só decorridos três anos e meio voltaria a erguê-las de novo.


NOTAS

11. Nasceu em Souto da Casa – Fundão, em 16/12/1894 e faleceu em Lisboa em 21/5/76.
Oficial do Exército de Administração Militar, passou â reserva como capitão a seu pedido, em 1937. Licenciado em Direito por Coimbra e diplomado pela Escola Colonial. Advogado e funcionário público no Ministério da Guerra. Participou durante a 1a Grande Guerra na expedição a Moçambique onde se distinguiu e foi condecorado. Combatente contra a ditadura, esteve preso vários meses em 1929. Foi iniciado na Loja Revolta, de Coimbra, com o nome simbólico de João de Barros, onde foi Venerável. Foi um dos fundadores da
Loja Rebeldia (1929). Desempenhou altos cargos no Grande Oriente Lusitano Unido, incluindo o de Grão-Mestre.

12. Nasceu em Barril do Alva – Arganil. Licenciado pela Universidade de Coimbra, leccionou nessa Universidade e em vários liceus, tendo deixado várias obras publicadas, sobretudo poéticas.

13. Foi capitão do Exército. Grande activista republicano, participou activamente no 5 de Outubro de 1910, tendo, na sequência da instauração da ditadura, participado em vários movimentos contra o regime, sofrendo por isso, várias prisões, pelo que foi demitido do Exército. Foi presidente da Direcção do Sport Lisboa e Benfica (16°) nos anos de 1938-1939. Participou sempre nos trabalhos da Loja Rebeldia até ao seu falecimentos há poucos anos.

14. Nasceu em Leiria em 5/4/1897 e faleceu em Lisboa em 27/8/70. Funcionário público trabalhou na Administração-geral dos Correios e Telégrafos. Iniciado em 1926 na Loja Simpatia e União com o nome simbólico de Myriel, foi venerável da Loja José Estêvão, tendo mais tarde ingressado na Loja Rebeldia.

15. Natural de Porto Santo – Madeira, advogado, destacado republicano, fundou em 1918 um partido regional, Partido dos Trabalhadores e foi Ministro das Finanças entre 1924 e 1925, tendo sido iniciado na Loja Rebeldia.

16. Natural dos açores, deixou obra poética publicada.

17.0 Doutor António Pires de Carvalho, antigo ministro republicano, nasceu em Casal de Ermio em 30 de Março de 1864 e faleceu em 2 de Setembro de 1947. Ilustre político, trabalhou activamente para a Revolução de 5 de Outubro, como um dos seus principais intervenientes. Doutor em Medicina peia Universidade de Coimbra e republicano desde os bancos da escola, António Pires de Carvalho participou na Revolução de 31 de Janeiro, no Porto, como membro do comité de Coimbra. Já em 1908 havia sido nomeado presidente da comissão municipal republicana de Gaia e do Centro Democrático da Lousa. Em 1911
foi eleito deputado às Constituintes pelo círculo de Coimbra. Foi membro do directório do Partido Republicano Português, onde militou muitos anos e, mais tarde, do directório da Esquerda Democrática. Foi também governador civil do distrito de Coimbra e exerceu o cargo de director das penitenciárias de Coimbra (nomeado por Afonso Costa) e de Lisboa.
Após o movimento revolucionário de 19 de Outubro de 1921, sobraçou a pasta do Comércio e interinamente, a do Trabalho, do governo presidido pelo coronel Manuel Maria Coelho. Amigo íntimo de António José d'Almeida – terceiro presidente da República, de 1919 a 1923 — António Pires de Carvalho aparece referido em várias ocasiões, pela pena do único dos mais altos dignitários que em toda a l República (1910-1926) se manteria no cargo até ao fim do mandato e que foi também conhecido pêlos invulgares dotes de Eloquência.

18-Notável advogado, natural dos Açores, a quem Vitorino Nemésio dedicou o seu livro Mau tempo no Canal, na década de 10 do século XX, publicou um importante trabalho sobre a Reforma Agrária em Portugal.

19. O Dr. António de Freitas Pimentel (1901-1981), médico e político, nascido a 15 de Maio, era filho de António de Freitas Pimentel e de Maria do Rosário Trigueiro Pimentel. Frequentou os Liceus da Horta e de Angra do Heroísmo e ingressou na Faculdade de Medicina de Lisboa, onde se licenciou em 1929.
Em 1930. Após o casamento, fixou-se na cidade da Horta. Nessa cidade, para além do exercício da medicina desenvolveu uma intensa acção de natureza política.
Depois de ter militado na oposição com Manuel José da Silva e outros faialenses. Foi nomeado em 7 de Agosto de 1935, Vice-Governador Civil do distrito. Em 28 de Novembro de 1945 foi nomeado Presidente da Câmara Municipal da Horta cargo que desempenhou com grande dinamismo e competência. Por esse motivo, foi nomeado Governador Civil do Distrito da Horta em 30 de Junho de 1953, cargo que exerceu com elevada capacidade
política durante 18 anos. Em 1973, foi eleito Deputado pelo Círculo Eleitoral da Horta Assembleia Nacional, cargo que exerceu até 25 de Abril de 1974. Dos muitos empreendimentos que levou a efeito no desenvolvimento das populações do Distrito da Horta, para além dos vistos de emigração que conseguiu por ocasião do vulcão dos Capelinhos de 1957, destacam-se as seguintes grandes obras: - a construção do Aeroporto da Horta, da Avenida Marginal da Horta, do Aeroporto das Flores, do Hospital das Flores, da Central Hidroeléctrica das Flores e respectiva rede de distribuição; - a ampliação das redes de estradas e de águas das ilhas do Faial, Pico, Flores, e Corvo. Faleceu em 14 de Abril de 1981.

20. Foi membro do Comité Central do PCP nos anos 40 do século XX. Teve de se desligar da Maçonaria em Geral e da Loja Rebeldia em particular, por ordem de Álvaro Cunhal. Veio a Falecer em África, afastado das actividades políticas.

21. Foi membro do Comité Central do P.C.P.,

22. Médico e destacado republicano.

23. Médico, tendo exercido clínica em Alcochete onde granjeou fama, foi um destacado membro do PCP.

24. Pertenceu à primeira Comissão Central do Movimento de Unidade Democrática (MUD) em 1945.

25. Fez muita coisa na vida, mas foi como militante das causas públicas que o médico, professor, ministro e cidadão portuense Eduardo Santos Silva mais se notabilizou. Artur Santos Silva foi um cidadão ilustre, um homem que soube dar outra dimensão à palavra e que, ao longo das suas intervenções públicas de quase 70 anos, lutou por ideais de tolerância e que sempre condenou o salazarismo, o «silêncio impressionante de vozes abafadas.

26. Professor universitário nasceu em Coimbra em 1904. Foi professor catedrático do Instituto Superior de Agronomia. A seguir ao 25 de Abril de 1974, foi Presidente da Assembleia Constituinte de onde saiu a nova Constituição da República Portuguesa. Deixou várias obras publicadas sobre agronomia rural.

27. Conselheiro José Maria Barbosa de Magalhães Godinho. Foi Provedor de Justiça entre 1976 e 1981. Licenciado Pela Faculdade de Direito de Lisboa. Advogado. Membro do Conselho Distrital e Geral da Ordem dos Advogados (1947/1964) Delegado do Conselho dos Advogados ao Conselho da União Internacional dos Advogados (1962/1980). Participou nas principais acções da oposição democrática contra o regime anterior. Fundador e membro da Comissão Executiva do Movimento de União Democrática Anti-Fascista (MUNAF-1943) e do Movimento de Unidade Democrática (MUD-1945). Apoiou as candidaturas a Presidente da República de Norton de Matos (1949), Quintão Meireles (1953) e Humberto Delgado (1958). Redactor e signatário do Programa para a Democratização da República (1961). Membro da Comissão Eleitoral de Unidade Democrática (CEUD). Fundador do Partido Socialista. Presidente da Comissão da Lei Eleitoral (1974/1975). Conselheiro de Estado (1976/1981). Membro do Conselho Superior de Magistratura. Membro do Grupo Português do Tribunal de Arbitragem de Haia (1975/1988). Juiz Conselheiro e Vice-Presidente do Tribunal Constitucional (1983/1989).
Fundador e Presidente da Associação para o Progresso do Direito (1981/1986).

28. Nasceu em Lisboa em 18/1/1906 e faleceu nesta cidade em 5/5/69. Formado em História e Filosofia peia Faculdade de Letras de Lisboa, foi escritor, escultor e político, tendo publicado diversas obras de História, Filosofia, Romance e Arte. Foi um dos fundadores do M.U.D. (1945) a cuja Comissão Central Pertenceu. Participou depois em todos os movimentos e campanhas contra a ditadura. Foi iniciado na Loja Rebeldia em 1930, com o nome simbólico de Nemo.

29. Nasceu em Lisboa em 30/7/11 e faleceu nesta cidade em 16/7/80. Oficial da Marinha, foi Contra-Almirante. Aderiu ao Estado Novo, tendo sido o último ministro da Marinha do regime (1968/1974), transitando do governo de Salazar para o de Marcelo Caetano. Iniciado na Loja Rebeldia com o nome simbólico de Nelson, passou mais tarde a coberto.

30. Nasceu em 1907 e faleceu em 1998. Militar, foi aposentado no posto de brigadeiro. Presidiu ao Comité Olímpico Português (1977/1980).

31- Nasceu em Faro em 13 de Março de 1905 e faleceu em Lisboa em 25 de Outubro de 1992. Foi um dos fundadores em 1923, da Mocidade Republicana. Em 1926 formou-se na Faculdade de Direito de Lisboa onde se doutorou em 1934. Advogado, professor de Direito, nomeadamente, no Instituto de Criminologia de 1930 a 1935 e posteriormente, na Faculdade onde se doutorou, leccionou Direito Processual Civil e Prática Extrajudiciária, tendo passado a professor catedrático em 1958 - Após a Revolução de 25 de Abri! de 1974, presidiu ao 1° Governo Provisório (6/5/74 a 9/7/74).
Publicou imensos artigos em jornais e revistas, assim como cursos académicos.

ORIENTAÇÃO BIBLIOGRÁFICA

Graça e J.S. da Silva Dias, Os Primórdios da Maçonaria em Portugal, 4.vols., I.N.I.C., Lx.,1980.

Marques, A. H. de Oliveira, A Maçonaria e o Estado Novo, Ed. D. Quixote,
Lisboa. 1980.

Dicionário de Maçonaria Portuguesa, 2 vols., Ed. Delta, Lisboa, 1986.

FONTES DOCUMENTAIS

Arquivos do Grémio Rebeldia

Nenhum comentário: